domingo, 28 de julho de 2013

Em nome da ostentação da celebração, dane-se o sossego alheio

Moro em uma bucólica rua, quase alameda em toda a sua extensão, em um dos bairros do considerado "Recife Antigo". Um lugar super tranquilo para se morar. Nos finais de semana, ouvimos os passarinhos, por vezes cigarras e outros sons tão distantes da maioria dos moradores das grandes cidades. O prédio em que resido, habitado em sua maioria por casais jovens e idosos, fica bem defronte a uma tradicional escola católica, com sua igreja secular, poucos anos atrás elevada à categoria de basílica menor. Tamanha a imponência da edificação, celebrações de casamentos no local são disputadíssimas. Além do mais, há um enorme estacionamento à disposição dos convidados. Acontece que, de vez em quando, certos momentos do evento, como quando da entrada da noiva ou do encerramento da cerimônia, são marcados com estrondosos e quase infinitos estampidos de fogos de artifício (lá por volta das 22h ou mais). Convém destacar que, próximo de onde resido, nos dois lados, há edifícios residenciais com o mesmo perfil de moradores.

E parece que a moda de anunciar à sociedade o mais novo casal da cidade se tornou uma competição de luzes, cores e muito incômodo auditivo, sem a prévia anuência e concordância de toda a vizinhança (que pouco importa ter o sossego lesado). No meu bloco, há algumas senhoras grávidas, inclusive a minha esposa (a poucos dias de dar a luz à nossa segunda filha). No mesmo andar, temos como vizinhos de porta um casal de idosos, que já acorremos diante do ocorrido, pois o senhor (beirando os 80 anos) fora acordado aos sustos com o "bombardeio" adentrando-lhe o quarto em que dormia tranquilamente. Dia desses tivemos que ligar à secretaria de igreja para pedir a imediata suspensão do foguetório, que já havia ocorrido por duas vezes na mesma noite: durante a entrada da noiva e, pela duração da celebração, no momento do "sim". Pelo menos conseguimos, sob ameaça de chamarmos a polícia, evitar que tal se repetisse ao encerramento da cerimônia.

Dias atrás, tudo se repetiu. O nosso vizinho de andar, mais uma vez atordoado, ainda de pijamas, se dirigiu ao responsável pelo evento e pediu-lhe, encarecidamente, que não desse continuidade aos estampidos. Parece que, junto àqueles fartamente remunerados pela vaidade alheia, o pedido não surtirá efeito. Restou-nos encaminhar à Cúria Metropolitana apelo por proibição do foguetório e responsabilização da mesma por eventuais danos a toda a coletividade dos três prédios. E isso tudo diametralmente oposto ao que, por estes dias, conclama o Papa Francisco em visita ao nosso país para a JMJ.

O momento de fé passou a ser um momento de glamour e demonstração de ostentação, em todos os sentidos. Infelizmente, inclusive para o sossego de nosso sono e descanso, assim como para todos os moradores da vizinhança da referida igreja. Será que será preciso processar a Cúria para garantir o nosso direito ao repouso?

Um comentário:

  1. Concordo 100%, Tonton. Seu texto me fez lembrar um fato que, apesar de não tido ostentação, alterou a fração da vida de muita gente como eu. Na Av. Dantas Barreto, todos aguardavam seus respectivos ônibus que, sem porquê, demoravam. Depois de muito tempo, a resposta: uma procissão pela Nossa Senhora dos taxistas. Faço tudo para respeitar as religiões, mas quando estas me fazem, entre outras coisas, me atrazar...
    Sou laico e gostaria de ter um país laico também.

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